Olá, vamos falar sobre uma ferramenta simples e poderosa no centro do nosso corpo — nossa respiração. Essa força vital rítmica, que muitas vezes passa despercebida, tem o potencial de melhorar a clareza mental, aguçar o foco, proteger o cérebro, melhorar a neuroplasticidade e dar a você um novo senso de autocontrole 🤯. Vamos entender a ciência por trás do impacto profundo da respiração em nossa saúde mental e física, mas também ver conselhos práticos e técnicas para aproveitar o poder da respiração.
O cérebro depende de um fornecimento constante de oxigênio e glicose para manter a funcionalidade ótima, preservando a integridade neuronal, facilitando a transmissão sináptica e garantindo operações cognitivas suaves. É digno de atenção o fato que o cérebro representa aproximadamente 20% da demanda energética do corpo, um número notável dado o seu tamanho.
Uma respiração superficial ou rápida pode levar a uma entrega subótima de oxigênio ao cérebro, acarretando um declínio nas funções cognitivas, no tempo de atenção e no desempenho geral em tarefas mentais. Isso destaca a importância de práticas de respiração consciente para a melhoria de nossas funções cognitivas, mas também para o bem-estar físico, pois contribui para uma melhor gestão do estresse.
Faça pausas e
respire de forma consciente.
Incorporar exercícios de respiração lenta em sua rotina pode ser uma estratégia simples, mas poderosa, para aumentar a clareza mental, a concentração e a produtividade. Incentivar os funcionários a fazerem pequenas pausas conscientes para respirar ao longo do dia pode promover uma atmosfera de trabalho mais focada, calma e eficiente, beneficiando tanto o indivíduo quanto o desempenho organizacional.
A Fisiologia da Respiração
Quando nos envolvemos em respiração lenta e profunda, ativamos o sistema nervoso parassimpático, responsável pelo repouso e digestão, atenuando o estresse do corpo. Essa ativação é mediada pelo nervo vago, um componente crítico do sistema nervoso autônomo que serve como a rodovia do corpo para a comunicação entre o cérebro e vários sistemas de órgãos (Porges, 2007).
Podemos aumentar a força e a resistência dos músculos respiratórios com a prática da respiração lenta. Isso leva a um aumento da ventilação pulmonar e melhoria da eficiência da troca de gases (Li, T.T. et al., 2023). Tão importante quanto respirar lentamente é respirar pelo nariz, pois regula o volume de ar que inalamos e garante que ele seja devidamente filtrado, aquecido e umidificado antes de chegar aos pulmões. A respiração nasal também produz óxido nítrico, uma molécula que desempenha um papel crucial no aumento da circulação e na entrega mais eficiente de oxigênio às células, incluindo as células cerebrais.
O oxigênio é vital para a função cerebral, mas o nível de dióxido de carbono (CO2) no nosso sangue é igualmente importante. O equilíbrio certo de dióxido de carbono é necessário para a liberação de oxigênio da hemoglobina nas células sanguíneas para os tecidos do corpo, um fenômeno conhecido como efeito Bohr. Níveis altos de CO2 reduzem a afinidade da hemoglobina pelo oxigênio, facilitando a liberação de oxigênio para os tecidos que mais precisam.
A Neurociência da Respiração Profunda
Ao respirarmos, produzimos sequências de sinais uniformes e ritmadas que acompanham o movimento da respiração. Esses estímulos chegam ao cérebro em três áreas do córtex: o córtex olfativo recebe estímulos do bulbo olfativo; o córtex somatossensorial recebe estímulos dos movimentos do tórax e abdômen, e o córtex insular recebe quimiorreceptores – mudanças nos níveis de oxigênio e dióxido de carbono no sangue – e mecanorreceptores nos pulmões, diafragma e órgãos internos.
Esses estímulos rítmicos produzem três padrões de atividade cortical através do neocórtex: oscilações neuronais, aumento da potência de ondas cerebrais tipo gama e cronometragem das transições de fase na atividade da rede neuronal em grande escala. Esse ritmo ajuda a sincronizar grandes porções da rede cortical em processos mais lentos, afetando a eficiência das funções cerebrais. À medida que o cérebro sincroniza com a respiração, outras funções, na busca por precisão, também tendem a sincronizar com ela, como os movimentos dos olhos e dedos de um pianista tocando piano (Heck, D.H. et al. 2017).
A potência da oscilação gama e o tempo de transição de fase estão fortemente envolvidos na função cognitiva, ligando diretamente a respiração aos processos cognitivos (Heck, D.H. et al., 2017). Essa sincronização pode impactar processos cognitivos como tomada de decisão, atenção e percepção sensorial.
A respiração nasal e oral provocam diferentes padrões de atividade eletroencefalográfica. A respiração nasal impulsiona oscilações de ondas tipo delta e modulações de potência gama em uma área não olfativa do neocórtex. A estimulação de oscilações delta sugere que a respiração nasal pode ajudar a induzir um estado de relaxamento e recuperação no cérebro, mesmo quando não estamos dormindo. Isso pode ser particularmente benéfico no gerenciamento do estresse e na promoção de um estado de descanso que favoreça a recuperação da fadiga cognitiva. A modulação da potência gama pela respiração nasal indica que esse tipo de respiração pode melhorar as capacidades cognitivas, aumentar o foco e a velocidade de processamento (Heck, D.H. et al. 2017).
Respire pelo nariz e lide melhor
com o estresse.
Imagens de ressonância magnética funcional (fMRI) revelaram que a respiração controlada pode levar à diminuição da atividade na amígdala, uma estrutura específica dentro do sistema límbico que é particularmente associada ao processamento emocional e formação de memória (Hölzel et al., 2013). Aumentos na taxa de respiração sincronizam com a ativação da amígdala durante estados de ansiedade ou medo e têm um papel modulador na atividade neuronal do neocórtex.
Mas a respiração pela boca não induz à mesma sincronização de padrões e está correlacionada com distúrbios do sono e transtorno do déficit de atenção com hiperatividade (TDAH) (Campanelli, S. et al., 2020).
Outro efeito dos exercícios de respiração, como a respiração lenta e ritmada, é a criação de um ambiente ótimo para o cérebro formar novas conexões, a neuroplasticidade. O estresse pode suprimir a neuroplasticidade, mas o estado de relaxamento produzido pela respiração profunda favorece-a. A meditação focada na respiração foi associada ao aumento da densidade da matéria cinzenta no hipocampo, uma área do cérebro importante para aprendizado e memória (Hölzel et al., 2011). Além disso, incorporar a retenção de respiração pode aumentar significativamente o fluxo sanguíneo para o cérebro. Essa circulação aumentada apoia o crescimento de células cerebrais e fomenta a neuroplasticidade. Para uma compreensão mais profunda de como esse processo funciona, seguimos com a próxima sessão.
Os Efeitos Cognitivos
Além de todos os resultados da respiração nasal e lenta mencionados acima, podemos aprofundar em diferentes práticas de respiração e suas influências na função cognitiva.
- Vibração: A prática de uma respiração consciente adicionada de vibração – reproduzindo o som de abelhas zumbindo – durante a exalação nasal, reduziu o tempo de reação do sinal de parada, a capacidade de suprimir respostas motoras. Uma inibição de resposta aprimorada é indicativa de um controle cognitivo mais flexível (Campanelli, S., 2020). O modo de ação da vibração ainda não é completamente elucidado, mas alguns hipotetizam que a vibração pode ativar o nervo vago e induzir um estado de relaxamento, ou pode aumentar a sincronia dos ritmos cerebrais em áreas associadas à atenção.
- Respiração Rápida: Após uma prática de respiração rápida e intensa, expelindo ativamente o ar com contrações abdominais em um ritmo mais acelerado, as pessoas reduziram o tempo de reação visual e auditiva, mas pelo efeito oposto da respiração lenta. Isso ativa o sistema nervoso simpático, que prepara o corpo para respostas de “luta ou fuga“, melhorando o desempenho sensório-motor (Campanelli, S., 2020). Alguns atletas de alto desempenho e forças armadas dos EUA afirmaram usar essa respiração antes de um grande jogo ou uma operação especial (Nestor, J., 2020).
- Retenção de Respiração: Reter o ar com os pulmões cheios aumenta os níveis de dióxido de carbono, o que leva à vasodilatação e ao aumento do fluxo sanguíneo cerebral. Este mecanismo é uma resposta do corpo para melhorar o transporte de oxigênio e a remoção de CO2 dos tecidos. Além de oxigênio, o aumento do fluxo sanguíneo também pode facilitar a entrega de nutrientes essenciais ao cérebro, como glicose e ácidos graxos, que são cruciais para o funcionamento e a saúde neuronais. Um fluxo sanguíneo aumentado ajuda na remoção eficiente de resíduos metabólicos do cérebro, prevenindo a acumulação de substâncias potencialmente tóxicas, e pode influenciar a liberação e a recaptura de neurotransmissores, substâncias químicas que transmitem sinais no cérebro e afetam tudo, desde o humor até a cognição.
Estudos revelaram que os níveis de oxigenação no córtex pré-frontal, que é uma área do cérebro essencial para processos cognitivos superiores, aumentam quando o indivíduo faz respiração diafragmática profunda (Pujari, V. e Parvathisam, S., 2022).
A respiração profunda permite que os indivíduos fixem firmemente sua atenção no presente e melhorem o desempenho cognitivo e a estabilidade emocional. Indivíduos mais conscientes podem regular seus sentimentos com mais sucesso e ter maior controle sobre como reagem às situações (Campanelli, S. et al., 2020). Isso também está relacionado à resiliência mental, a capacidade de se recuperar rapidamente do estresse. Ativar o sistema nervoso parassimpático e reduzir a atividade do sistema nervoso simpático, responsável pela resposta ao estresse, sugere que a respiração profunda pode aumentar a resistência do corpo ao estresse (Brown & Gerbarg, 2005).
Respire de forma diferente para
obter efeitos diferentes.
Atenção, descontração, resiliência e proteção neuronal.
Neuroproteção
Nosso cérebro precisa de oxigênio para funcionar e se manter vivo. Quando não recebe oxigênio suficiente, uma condição chamada hipóxia severa, isso pode causar vários problemas sérios, como perda de energia (depleção de ATP), produção excessiva de substâncias nocivas (espécies reativas de oxigénio), acúmulo de cálcio e inflamação. No entanto, estudos e pesquisas mostram que uma exposição moderada e intermitente a baixos níveis de oxigênio pode, na verdade, tornar o cérebro mais resistente a esses tipos de danos, isquemia (redução ou interrupção do fluxo sanguíneo) e outros estresses.
A hipóxia intermitente (IH) refere-se à exposição alternada entre períodos de respiração normal e períodos de respiração com baixo conteúdo de oxigênio. Quando o conteúdo de oxigênio é reduzido, mesmo por períodos curtos, isso pode desencadear uma série de respostas no corpo, promovendo remodelação e recuperação. O corpo começa a produzir mais de algumas substâncias, como o óxido nítrico e as Espécies Reativas de Oxigênio (ROS), além de reagir à própria diminuição de oxigênio. Essas substâncias e a situação de menos oxigênio dão um empurrãozinho para que o corpo ative um sistema de defesa interno. Esse sistema de defesa faz com que o corpo produza proteínas especiais que protegem as células contra danos, protegendo-as contra o estresse causado pela falta de oxigênio, a inflamação e a falta de energia. Para fazer isso, o corpo usa um tipo de sinalização interna, chamada sinalização por proteína quinase, que basicamente diz às células para ligarem suas defesas contra esses problemas. (Sprick, J.D. et al. 2019).
Esse processo foi inicialmente direcionado para desencadear adaptações fisiológicas para melhorar a eficiência do corpo no uso de oxigênio. As adaptações podem incluir aumento da produção de glóbulos vermelhos, eficiência aprimorada na utilização de oxigênio pelas células e melhor vascularização. O objetivo principal é frequentemente relacionado ao aprimoramento do desempenho atlético, adaptação a altitudes elevadas ou como abordagem terapêutica em certas condições médicas, como apneia do sono, doenças cardiovasculares e até condições neurológicas. A exposição a níveis baixos de oxigênio na hipóxia intermitente é sistêmica, ou seja, afeta todo o corpo (Navarrete-Opazo, A. & Mitchell, G. S., 2014). Podemos alcançar esses efeitos treinando com respiração ritmada e retenções prolongadas da respiração.
Outro mecanismo é o pré-condicionamento isquêmico que envolve induzir períodos curtos e controlados de fluxo sanguíneo reduzido (e, portanto, oxigênio) para tecidos ou órgãos específicos, seguidos por reperfusão (restauração do fluxo sanguíneo). Esse método é usado para pré-condicionar o tecido ou órgão a resistir aos efeitos de um evento isquêmico subsequente mais grave (um período prolongado de fluxo sanguíneo reduzido). O mecanismo é pensado para ativar vias celulares protetoras que reduzem o dano tecidual durante episódios isquêmicos subsequentes. Ocorre em um tecido de cada vez, como tecido miocárdico ou tecido não cardíaco, incluindo rim, cérebro, músculo esquelético, pulmão, fígado e tecido esquelético. A proteção começa imediatamente, dentro de minutos da lesão isquêmica de pré-condicionamento e dura algumas horas, e uma fase tardia se desenvolve com regularidade circadiana, vinte e quatro horas depois, e reaparece ciclicamente ao longo de vários dias, e então se dissipa (Dardik, I.I., 2002).
Isso significa que você precisa ter um treinamento de respiração disciplinado para manter sua proteção. A respiração rápida e intensa aumenta a frequência cardíaca e a pressão sanguínea, reduzindo os níveis de dióxido de carbono, o que produz vasoconstrição e reduz o fluxo sanguíneo cerebral nas artérias intracranianas. Outros estudos sugerem um protocolo de trabalho respiratório e exercícios aeróbicos para produzir pré-condicionamento isquêmico no tecido miocárdico (Dardik, I.I.,2002).
Aviso!
É importante enfatizar que você nunca deve forçar o seu corpo com práticas de respiração, o ganho em condicionamento respiratório e o aumento no tempo de retenção são adquiridos através de treinamento contínuo e com a orientação de um instrutor certificado. Sempre consulte o seu médico de confiança antes de iniciar qualquer treinamento.
Na Prática
- Para Estar mais Alerta: A respiração rápida e curta pode ser executada por alguns segundos para aumentar a alerta e a prontidão para tarefas desafiadoras. Foque em expirar com intensidade e velocidade, como um sopro rápido, e a inspiração é passiva acompanhando o ritmo mais acelerado.
- Para Melhorar o Relaxamento e o Foco: Práticas de respiração lenta e profunda e retenção de respiração podem ser empregadas para relaxar a mente, aumentar o foco e facilitar um estado propício à meditação. Respire profundamente, projetando o abdômen para fora, expandindo as costelas lateralmente e elevando sutilmente o peito, retenha o ar nos pulmões enquanto for confortável e expire lentamente descendo o peito, aproximando as costelas e contraindo o abdômen.
Aviso!
Pessoas com estresse crônico têm um sistema nervoso simpático ativado e um estado constante de luta ou fuga. Portanto, foque no treinamento de respiração profunda. Comece com a respiração lenta e, quando sua respiração diária estiver nesse nível, você pode começar com retenções e treinamento de respiração rápida. Procure um instrutor de respiração para ajudá-lo a aprender todas as técnicas.
Conclusão
A respiração, uma função autonôma frequentemente negligenciada, é uma poderosa aliada na busca por clareza mental e melhor desempenho cognitivo. Enquanto a comunidade científica continua a descobrir as conexões entre nossos padrões de respiração e a função cerebral, podemos aproveitar essas técnicas ancestrais para transformar nossos dias em produtividade e bem-estar.
Uma simples respiração nasal, diafragmática e lenta pode impactar positivamente a cognição; se sua respiração natural é superficial e rápida, procure prestar atenção à sua respiração e torná-la mais profunda. Aprenda outros tipos de técnicas de respiração, com retenções e ritmo, para obter resultados ainda melhores de cognição, resiliência mental, regulação emocional e estímulo da intuição.
Até o próximo artigo!
Referências:
- Nestor, J. Respire: A nova ciência de uma arte perdida. Riverhead Books. May 26, 2020.
- DeRose. Tratado de Yôga. Egrégora. 4 julho, 2016.
- Porges, S. W. (2007). The polyvagal perspective. Biological Psychology, 74(2), 116-143.
- Li, T.T. et al. (2023). Effect of breathing exercises on oxidative stress biomarkers in humans: A systematic review and meta-analysis. Frontiers in Medicine. 10, 1121036.
- Heck, D.H. et al. (2017). Breathing as a Fundamental Rhythm of Brain Function. Frontiers in Neural Circuits. 10, 115.
- Hölzel, B. K. et al. (2011). Mindfulness practice leads to increases in regional brain gray matter density. Psychiatry Research: Neuroimaging, 191(1), 36-43.
- Campanelli, S., Tort, A.B.L. and Lobão-Soares, B. (2020) Pranayamas and Their Neurophysiological Effects. International Journal of Yoga. 13(3), 183-192.
- Pujari, V. and Parvathisam, S. (2022). Breathing Your Way To Better Brain Function: The Role Of Respiration In Cognitive Performance. Journal of Pharmaceutical Negative Results. 13(7), 8214-8219.
- Brown, R. P., & Gerbarg, P. L. (2005). Sudarshan Kriya yogic breathing in the treatment of stress, anxiety, and depression: part I—neurophysiologic model. Journal of Alternative and Complementary Medicine, 11(1), 189-201.
- Sprick, J.D. et al. (2019). Ischaemic and hypoxic conditioning: potential for protection of vital organs. Experimental Physiology. 104(3), 278-294.
- Navarrete-Opazo, A. & Mitchell, G. S. (2014). Therapeutic potential of intermittent hypoxia: A matter of dose. American Journal of Physiology-Regulatory, Integrative and Comparative Physiology, 307(10), R1181-R1197.
- Dardik, I.I. (2002). Systems and methods for breathing exercise regimens to promote ischemic preconditioning. GB2390689A.